quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Coisas de Criança

A nossa casa tinha dois quartos, sendo que o dos meus pais, bem maior, era dividido em dois espaços distintos. Logo na entrada da porta, ficava a cama do casal, com seu colchão de capim e uma colcha de retalhos, feita pela minha mãe. Um criado mudo de madeira marrom e uma camiseira compunham o ambiente. Mais à frente, ficava o meu berço, de madeira.

Este berço era itinerante e passava de casa em casa para uso dos bebês que iam nascendo na família. Primeiramente, fui eu quem o utilizou, depois veio o Antonio Luiz, a Maria Inês, a minha irmã Kika, o José Bueno, a Iolanda, o Fernando, o Alfredo, a Cleide e a mais nova dos primos, a Márcia. Depois de algum tempo, ele foi pintado de azul e, não sei por que motivo, teve seus pés cortados, ficando o berço um pouco mais baixo e sem o dispositivo de balanço. Mais tarde, serviu também para a minha sobrinha Natália e até as minhas filhas, Fernanda e Juliana, tiveram o gostinho de dormir nele. Soube que ele ainda existe e está na casa do tio Bento.

Quando a minha irmã nasceu, eu tinha três anos e adorava ficar tomando conta do bebê enquanto ele estava naquele berço. Nesses momentos, normalmente a minha mãe estava no tanque cuidando das roupas, colocando-as no quarador ou estendendo-as no varal. De vez em quando, ela olhava pela janelinha do quarto e perguntava:

- Filho, está tudo bem com o bebê?

Eu respondia, com cuidado, para minha irmã não se assustar:

- Tá sim, mamãe.

Assim que caía sua chupeta da boca, ela começava a querer chorar e eu a repunha imediatamente a fim do bebê ficar bem quietinho. Queria deixá-la sempre entretida. Numa dessas tardes em que eu estava à beira do berço tomando conta da minha irmã, eu tinha comigo uma tigela de amendoim. Enquanto ia comendo os amendoins, balançava o berço e, de vez em quando, colocava em sua boca a chupeta. Mas, tadinha, ela só tinha aquela chupeta sem gosto para pôr na boca. Foi esse pensamento que me fez ter uma idéia.

A minha mãe, terminando a sua tarefa, veio ao quarto e perguntou:

- Ela ficou bem?

Eu, prontamente, respondi:

-Ficou, sim, mamãe! Até dei um amendoim para ela comer.

Minha mãe, que sempre foi muito calma, assustada quase gritou:

- Seu moleque, ela é um bebezinho, como foi que você deu um amendoim para ela?!

Eu, com aquela cara de sapeca, fui logo me defendendo:

-Mas mãe, ela ficou olhando para mim, batendo as mãozinhas e as perninhas e eu achei que ia ficar com vontade, dei para ela e ela gostou, até ficou bem quietinha. Se eu não desse, ela podia ficar desconfiada, né?

A minha mãe ficou o resto do dia e quase a noite toda rezando para que a Nossa Senhora das Graças, sua santa de devoção, protegesse o bebê, pedindo para que nada de mal pudesse acontecer à minha irmãzinha.

No outro dia, quando ela foi trocar a sua fralda, que na época era de pano, estava lá o grãozinho de amendoim inteirinho!

Que alívio!

5 comentários:

  1. Essa eu não sabia, "vc dá amendoim para uma Moreira já novinha" kkkk...... é perigoso.
    valeu, gde abraço

    ResponderExcluir
  2. Mt boa a história João, como sempre!

    Grande abraço,

    Eric

    ResponderExcluir
  3. Parabéns João é muito legal saber que tem pessoas como vc e esse blog tras as histórias do 77 e da freguesia.
    um forte abraço!

    ResponderExcluir
  4. Que linda esta história,agente precisava de muito pouco pra viver muito feliz, parabéns João.
    Grande abraço.

    ResponderExcluir